Hoje é Sexta-feira Santa, talvez a mais silenciosa que a nossa geração viu, no ar um sentimento de inquietude, mas este é o sentido deste dia, que improvisadamente este Ano Santo de 2020 nos trouxe.
Em tantos lares e leitos pelo mundo, muitos fazem a sua experiencia de entrega total e irrestrita a Deus. Meus caros que o exemplo do Senhor que serviu-nos até ao ponto de experimentar as situações mais dolorosas para quem ama: o abandono.
Também nós hoje, em meio ao drama da pandemia, perante tantas certezas que se desmoronam, diante de tantas expectativas traídas, sentimos o abandono que nos aperta o coração e é nesta hora escura, que Jesus diz a cada um:
“Aproxima-se a hora e já chegou, quando vocês serão espalhados cada um para a sua casa. Vocês me deixarão sozinho. Mas eu não estou sozinho, pois meu Pai está comigo. Eu disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo”. (Jo16,32-33)
A liturgia da Sexta-feira Santa tem como centro principal, mostrar o esvaziamento de Jesus: “esvaziou-Se a Si mesmo, tomando a condição de servo” (Fl2,7).
No fundo do coração, nasce uma tal decepção que a vida parece deixar de ter sentido. É assim, porque nascemos para ser amados e para amar e o mais doloroso é ser traído por quem nos prometera ser leal e solidário. Não podemos sequer imaginar como terá sido doloroso para Deus, que é amor.
Meus nobres no Evangelho de hoje, na cruz, Jesus diz uma frase, uma apenas: “Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?” (Mt 27, 46). É uma frase impressionante. Jesus sofrera o abandono dos seus, que fugiram.
Restava-Lhe, porém, o Pai. Agora, no abismo da solidão, pela primeira vez designa-O pelo nome genérico de “Deus”. E clama, “com voz forte”, “porquê?”, o “porque” mais dilacerante: “Por que Me abandonaste também Tu?” Podemos nos também elevar esta pergunta: Por que tudo isto?
E em resposta “Uma vez mais… por nós, para servir-nos.”
Porque quando nos sentimos encurralados, quando nos encontramos num beco sem saída, sem luz nem via de saída, quando parece que nem Deus responde, lembremo-nos que não estamos sozinhos. Portanto, nesta Sexta-feira Santa de 2020, lembremos que Jesus experimentou o abandono total, a situação mais estranha para Ele, a fim de ser em tudo solidário conosco.
Fê-lo por mim, por ti, por todos nós; fê-lo para nos dizer: “Não temas! Não estás sozinho. Experimentei toda a tua desolação para estar sempre ao teu lado, Eu venci o mundo!”.
Hoje, no drama da pandemia, perante tantas certezas que se desmoronam, diante de tantas expetativas traídas, no sentido de abandono que nos aperta o coração, Jesus diz a cada um: “Coragem! Abre o coração ao meu amor, segura na mão dos que estão em tua casa ao teu lado e saiba que eu estou convoco.” Lembremos que estamos no mundo, para amar a Ele e aos outros: o resto passa, isto permanece.
O drama que estamos atravessando neste período impele-nos a levar a sério o que é sério, a não nos perdermos em coisas de pouco valor; a redescobrir que a vida não serve, se não se serve. Porque a vida mede-se pelo amor. Então, neste dia santo da Semana Santa, em casa, permaneçamos diante do Crucificado contemplemos, o Crucificado!
Juntos em família reflitamos na medida do amor de Deus por nós. Diante de Deus, que nos serve até dar a vida, contemplando o Crucificado, peçamos a graça de viver para servir.
Procuremos contatar e consolar quem sofre, quem está sozinho e necessitado, um aceno da janela, uma chamada de telefone, um prato de comida, um pouco de água, uma prece, um olhar.
Nesta Sexta-feira Santa não repliquemos o erro de tantas sextas, onde pensávamos nos que nos faltava para comer ou beber a Páscoa. Não, nesta sexta não pensemos naquilo que nos falta; pensemos naquilo que temos, naqueles que temos e naqueles que talvez depois de muito tempo nos tem para fazer a Páscoa, pensemos no bem que podemos fazer.
O Pai, que sustentou Jesus na Paixão, hoje nos diz: “A graça do Senhor Jesus Cristo seja convosco.”(1Cor16,23). E na certeza de que Ele está no meio de nós! Animemo-nos também a nós a estar com Ele. É certo que amar, rezar, perdoar, cuidar dos outros, tanto em família como na sociedade, pode custar; pode parecer uma via-sacra, mas lembremo-nos: estamos com Ele!
Queridos amigos, olhai para os verdadeiros heróis que vêm à luz nestes dias: não são aqueles que têm fama, dinheiro e sucesso, mas aqueles que se oferecem para servir os outros, fazendo o que sempre fizeram, sendo Cristo para os outros.
Enfim, esta Sexta-feira Santa, é a mais rica para a nossa geração, pois estamos onde sempre deveríamos estar nas sextas santas, ouvindo o Cristo crucificado nos dizer: “Não tenhais medo de doar-se por Deus e pelos outros! Porque a vida é um dom que se recebe doando-se.”
Desejo a todas vós Theófilos, a Paz do Crucificado, que na cruz se derramou por toda a humanidade.
Senhor Tende piedade de nós! Cristo tende piedade de nós! Senhor tende piedade de nós!
Ó Deus, pela paixão de nosso Senhor Jesus Cristo destruístes a morte que o primeiro pecado transmitiu a todos. Concedei que nos tornemos semelhantes ao vosso Filho e, assim como trouxemos pela natureza a imagem do homem terreno, possamos trazer pela graça a imagem do homem novo. Por Cristo, nosso Senhor. Amém.